21 de agosto de 2011

Especial URSS-Um Novo Despertar

A era das Reformas- O Advento de Bóris Yeltsin 

 
Em março de 1989, pela primeira vez na União Soviética, realizaram-se eleições livres para a escolha do Congresso dos Deputados do Povo; 180 milhões de soviéticos foram à urnas, confiantes de que viviam um momento único de sua história. O pleito, de certa forma, referendou as diretrizes de Gorbatchev, pois acabou impondo humilhante derrota aos candidatos oficiais.

Nesse novo cenário político, surgia com força a figura de Bóris Yeltsin, eleito representante da cidade de Moscou com 89,4% dos votos e adepto de reformas mais aceleradas. Yeltsin havia sido prefeito de Moscou e importante figura do Partido Comunista. Logo que Gorbatchev lançou as propostas da glasnost e da perestroika, Yeltsin passou a defendê-las com vigor. Era um ultra reformista. Por isso, passou a sofrer violentas pressões dos conservadores e acabou renunciando a seus cargos e passando para a oposição.

Em fevereiro de 1990, uma nova legislação partidária permitiu a organização de partidos políticos. Era o fim da hegemonia absoluta do Partido Comunista, que vigorava desde a Revolução de 1917.

Logo ganhou força a Plataforma Democrática, frente política liderada por Bóris Yeltsin. Isso acentuava a pressão sobre Gorbatchev no sentido de ampliar as reformas políticas e econômicas.

Mas a tarefa de transformar as velhas estruturas não podia se concretizar de maneira tão rápida. Mais de 70 anos de centralismo, produção subsidiada e rigidez burocrática não se desfazem sem grandes transtornos. A passagem do modelo estatizado de produção para a economia de mercado gerou alta de preços e escassez de produtos, aumentando a insatisfação popular.

Enquanto isso, o movimento separatista, iniciado nas repúblicas bálticas em 1990, crescia e se espalhava para outras repúblicas.

Somente respostas positivas na economia poderiam reforçar os laços que mantinham juntas as quinze repúblicas soviéticas. Em março de 1991, um plebiscito em toda a União Soviética confirmou por larga maioria (76% ) o desejo de manter a união do país, na forma de uma “federação renovada de repúblicas soberanas”, com direitos iguais.

Ainda nesse ano, o Congresso dos Deputados do Povo aprovou um programa econômico para acelerar a introdução da economia de mercado, com a liberação dos preços, a privatização de empresas e o estímulo ao comércio exterior.

Gorbatchev achava-se numa posição delicada, pressionado de um lado pelos ultra-reformistas, sob o comando de Yeltsin, e de outro pelos comunistas ortodoxos, que faziam tudo para solapar as reformas em curso. 


O Golpe de Agosto de 1991 

Em 19 de agosto de 1991, uma notícia causou comoção mundial: a agência soviética Tass divulgou que Mikhail Gorbatchev havia deixado a presidência da União Soviética por “problemas de saúde”, e um certo Comitê Estatal de Emergência assumira o poder. O sentido era inequívoco: Gorbatchev fora vítima de um golpe de Estado. A “linha dura” do Partido Comunista pretendia reinstalar um regime totalitário.

Mas a população reagiu. Milhares de pessoas saíram às ruas e passaram a enfrentar os soldados e os tanques que se dirigiam ao edifício do Parlamento da República da Rússia. Barricadas impediam o avanço dos tanques, e sua tripulação era retirada à força de dentro dos veículos. Bóris Yeltsin passou a comandar a resistência, que ganhou até mesmo a adesão de muitos militares.

O noticiário dava conta de que o golpe fora liderado por Guennady Yanayev, vice-presidente da União Soviética; Bóris Pugo, ministro do Interior; Dmitri Yazov, ministro da Defesa, e Wladimir Kryuchov, chefe da KGB (a polícia secreta soviética).

Gorbatchev permaneceu 60 horas preso na Criméia, numa casa de praia onde tinha ido descansar. Aos poucos, os golpistas foram perdendo força diante da resistência de quase toda a nação. Graças à glasnost e à perestroika, a União Soviética mantinha agora contatos abertos com o exterior, que pôde acompanhar o desenrolar dos acontecimentos. A televisão do mundo todo transmitiu a imagem de um Yeltsin inflamado, discursando no alto de um tanque para uma multidão cheia de entusiasmo patriótico. Vários chefes de Estado do
Ocidente exigiram enfaticamente a recondução de Gorbatchev ao poder.

Após três dias de resistência, Yeltsin e os militares legalistas tinham recuperado totalmente o controle da situação, e os golpistas foram presos. Gorbatchev desembarcou livre em Moscou. De volta ao cargo, o líder soviético reafirmou seu compromisso com o socialismo democrático e sua intenção de somar forças com Yeltsin, agora extremamente fortalecido por comandar a resistência aos golpistas.

Afastada a ameaça antidemocrática, faltava à União Soviética superar seus grandes problemas econômicos e resolver a questão dos nacionalismos dentro do país, já que os movimentos separatistas,. principalmente nas repúblicas bálticas, não tinham cessado. 

A desintegração da URSS

O golpe de agosto de 1991 praticamente abriu as comportas para o movimento de independência das repúblicas que compunham a União Soviética. As repúblicas do Báltico já tinham tentado separar-se em 1990, mas foram severamente reprimidas, pagando com sangue sua ousadia. Com o fracasso do golpe, o cenário mudou totalmente. As forças conservadoras estavam derrotadas e quem mandava realmente era Bóris Yeltsin – e não mais Gorbatchev, cujo poder estava completamente esvaziado.

Já no mês seguinte, setembro, as repúblicas da Letônia, Estônia e Lituânia, uma após a outra, reafirmaram, agora em caráter definitivo, suas declarações de independência. A própria Rússia foi um dos primeiros países a reconhecer a independência dessas repúblicas.

Estava aberto o processo para as outras, que em sua grande maioria também se declararam separadas.

Outra conseqüência importante do golpe foi a suspensão, determinada por Yeltsin em toda a Rússia, das atividades do Partido Comunista, que implicou até mesmo o confisco de seus bens. A KGB, o poderoso serviço secreto soviético, teve sua cúpula dissolvida.
Gorbatchev admitiu a implosão da União Soviética, mas ainda tentou manter o vínculo entre as repúblicas, propondo a assinatura do chamado Tratado da União. Mas suas palavras não tiveram eco, e o processo de separação se tornou irreversível.

Em 4 de setembro de 1991, Gorbatchev, como presidente da União Soviética, Bóris Yeltsin, na qualidade de presidente da Rússia, e mais os líderes de outras nove repúblicas, em sessão extraordinária do Congresso dos Deputados do Povo, apresentaram um plano de transição para criar um novo Parlamento, um Conselho de Estado e uma Comissão Econômica Inter-Republicana. Embora tentasse estabelecer os parâmetros para uma nova união entre as diversas repúblicas, esse plano, na verdade, significava o desmantelamento formal da estrutura tradicional do poder soviético. De qualquer forma, a proposta acabou sendo aprovada.

Percebendo a importância de Gorbatchev para a estabilidade da nação, naquele momento, Yeltsin prometeu o apoio da República russa ao novo plano.

Enquanto isso, os líderes ocidentais também davam sinais de uma clara preferência pela permanência de Gorbatchev no poder, embora demorassem a assumir o compromisso de uma ajuda econômica mais efetiva à União Soviética.

O agravamento da situação econômica era justamente o que tornava mais delicada a posição de Gorbatchev. Decididamente, o povo soviético tinha perdido a paciência com os problemas econômicos, que se manifestavam na vida diária de cada cidadão. A desorganização da economia era visível nas prateleiras vazias dos supermercados e nas filas intermináveis para comprar os produtos mais corriqueiros, como sabonete ou farinha de trigo.

Aprovado o plano de mudanças, faltava agora conseguir a assinatura do Tratado da União com todas as repúblicas. Mas em 1º de dezembro de 1991 a situação se precipitou com a consolidação da independência da Ucrânia, aprovada em plebiscito por 90% da população.

Uma semana depois, numa espécie de golpe branco contra Gorbatchev, os presidentes das repúblicas da Rússia, Ucrânia e Bielo-Rússia, reunidos na cidade de Brest (Bielo-Rússia), criaram a Comunidade de Estados Independentes (CEI), decretando o fim da União Soviética.

Diante disso, James Baker, secretário de Estado norte-americano, declarou: “O Tratado da. União sonhado pelo presidente Gorbatchev nunca esteve tão distante. A União Soviética não existe mais”.
De fato, em 17 de dezembro Gorbatchev foi comunicado de que a União Soviética desapareceria oficialmente na passagem de Ano Novo.

No dia 21 de dezembro, os líderes de 11 das 15 repúblicas soviéticas reuniram-se em Alma Ata, capital do Casaquistão, para referendar a decisão da Rússia, Ucrânia e Bielo-Rússia e oficializar a criação da Comunidade de Estados Independentes e o fim da União Soviética.
Gorbatchev governava sobre o vazio. 

A Renuncia de Gorbatchev 
 

No dia de Natal, em cerimônia transmitida por satélite para o mundo inteiro, o líder soviético renunciou ao cargo de presidente e comandante chefe das Forças Armadas da União Soviética, transferindo a Bóris Yeltsin o controle do arsenal nuclear.

Nas palavras de um comentarista: “Gorbatchev é comunista e desabou com o comunismo sendo comunista. Assumiu o poder, casou em si uma das mais difíceis combinações humanas, a que une entusiasmo com prudência, entendendo que a tolerância, em determinadas circunstâncias, é uma virtude revolucionária, mas não ousou ir até o fim (...) Descontente com o autoritarismo (...), acreditou que a saída estava dentro do próprio comunismo e, para isso, bastaria reformulá-lo. Padeceu da utopia de que um sistema que esgota a sua experiência pode ser retocado em reuniões e protocolos (...) Gorbatchev nunca enxergou para fora do comunismo e aí parou e andou para trás. Perdeu. Isso não o faz um estadista de perspectivas limitadas mas, sim, leal à necessidade de entendimento, no círculo mesmo da História, que os homens têm de seu tempo e seu limite”. (Antônio Carlos Prado. Isto é/Senhor, 25/12/91.)
Fontes: Ed.Ática
Por Maria Helena Senise e Alceu Pazzinatto

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