Missão brasileira foi impedida de entrar na Líbia.
Fonte : Pravda.ru
Colaborou com o UND- Clara bral
Uma delegação brasileira integrada por parlamentares, jornalistas e ativistas sociais que tinha a missão de ir à Líbia verificar de perto a situação naquele país norte africano ficou retida em Túnis por não poder cumprir a missão a que estava designada em função dos intensos bombardeios da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).
Em Trípoli não dava para chegar de avião, somente por terra e numa estrada a partir da fronteira com a Tunísia. Próximo daquela área houve durante quatro dias na semana que passou (e continuaram) combates entre os chamados rebeldes e as forças leais a Muammar Khadafi.
Civis foram atingidos e ninguém pôde atravessar a fronteira para ir ao território líbio. Os que tentaram, como o médico líbio Heghan Abudeihna, que chegava do exterior via Tunísia foram atingidos. Integrantes da família do médico foram vitimados, segundo informações procedentes de Trípoli.
A OTAN não se importava em saber se seus ataques atingiriam ou não populações civis, o que o governo líbio garantira ter acontecido e até chamou delegações de várias partes do mundo, não só a brasileira, como dos Estados Unidos, Itália e muitos outros países, para verificar de perto os acontecimentos, como os efeitos dos bombardeios da OTAN sobre a população civil.
Quando chegava a vez dos brasileiros, a última delegação que faria um relatório a ser apresentado à Organização das Nações Unidas, a ação militar da OTAN impediu a entrada, que se fosse acontecer colocaria em risco os nove integrantes, inclusive este jornalista, dois parlamentares, Protógenes Queiroz (PC do B) e Brizola Neto PDT), entre outros. O próprio governo líbio recomendou a suspensão da ida para evitar algum incidente de consequências fatais.
Na verdade, ao longo de seis meses os insurgentes contra Khadafi só conseguiam avançar, e mesmo assim por um tempo curto, com a ajuda da OTAN. Sem isso, provavelmente a crise já teria terminado com algum tipo de acordo político. Um dos objetivos da presença da delegação brasileira na Líbia era o de também colaborar no sentido de a paz retornar ao país norte africano.
Uma das propostas que voltou a ser sugerida, inclusive apoiada em nota da delegação brasileira, é a da realização de um plebiscito, sob a supervisão da ONU, para que o povo decidisse o regime a ser seguido no país.
A OTAN, entretanto só queria mesmo sufocar a capital líbia com bombardeios diários para dificultar a entrada de víveres e mesmo ajuda humanitária que chegava à Líbia atravessando a estrada Djerba (na Tunísia) até Trípoli, a via de acesso pela qual a delegação brasileira chegaria a capital. Ou seja, o único objetivo da estratégia era o de sufocar Trípoli impedindo a entrada de alimentos e combustíveis. E na guerra da informação, os rebeldes ganhavam força, o que era negado pelo governo líbio.
Se as forças anti-Khadafi tivessem povo mesmo como apregoam teriam realizado manifestações populares massivas, o que nunca aconteceu até agora. Mesmo as fotos da entrada dos opositores em Trípoli, segundo as agências internacionais, indicam a ausência do povo.
Os constantes ataques aéreos e o cerco atual a Trípoli tinham por objetivo basicamente de acabar com o regime capitaneado por Khadafi. Por estas e muitas outras, países com reservas de petróleo, inclusive o Brasil, devem se cuidar, porque a cobiça é cada vez mais intensa. No caso líbio ainda se soma o fator geopolítico do controle da região.
Se os opositores de Khadafi tomarem mesmo o poder, como assinalam as recentes informações, o futuro do país norte africano é uma incógnita, mas já se pode adiantar algumas previsões, como, por exemplo, empresas petrolíferas voltarem a estar presentes nos moldes próximos aos dos anos anteriores da ascensão do dirigente que está sendo deposto com a ajuda fundamental da OTAN e ainda a participação bastante lucrativa de empresas estrangeiras na reconstrução da Líbia, que teve grande parte de sua infraestrutura destruída pelos constantes bombardeios.
Quando do retorno da delegação ao Brasil informação divulgada pelo Conselho Nacional de Transição através das agências internacionais dava conta que os opositores do regime ao entrarem em Trípoli prenderam três filhos de Khadafi, Saif al-Islam, Al-Saadi e Muhammad al-Khadafi, que seriam encaminhados para serem julgados pelo Tribunal Penal Internacional. Pouco tempo depois essa informação foi desmentida.
O Primeiro-Ministro David Cameron, do Reino Unido, um dos países integrantes da OTAN aproveitou as informações procedentes da Líbia para saudar a suposta vitória dos opositores de Khadafi e sobretudo tentar desviar a atenção da grave crise econômica enfrentada pelo seu país, especialmente os acontecimentos com os distúrbios ocorridos em Londres. Já o presidente Barack Obama pedia que Khadafi não resistisse para evitar mais derramamento de sangue.
Sobre Muammar Khadafi, as agências internacionais divulgavam nesta segunda-feira que o Pentágono informava que o líder líbio permanecia em seu país, enquanto chegou a circular que ele teria deixado a Líbia.
Resta agora aguardar a definição do quadro na Líbia e a confirmação ou não de que os comunicados do Conselho Nacional de Transição realmente representam com precisão os acontecimentos no país norte africano.
Todo o noticiário sobre a Líbia deve ser visto com cautela e reserva. Ao longo dos meses, visivelmente ocorreram manipulações da informação não apenas de agências de notícias internacionais, como da TV Al Jazeera, com sede no Catar, um dos países apoiadores dos opositores do regime líbio.
O referido canal por diversas vezes apresentou imagens sobre ocupação de cidades líbias pelos rebeldes, quando na verdade o quadro não estava definido e a ocupação ocorria geralmente depois dos bombardeios da OTAN, acontecendo em seguida a retomada por forças pró-Khadafi.
Não só em Benghazi, ocupada pelas forças opositoras, como em outras cidades, o maior ausente era o povo que não aparecia para comemorar supostas vitórias contra os soldados apoiadores de Muammar Khadafi, o que não era destacado, mas também não podia ser omitido nas imagens que apresentavam os opositores armados.
Integrantes da delegação brasileira que ficaram retidos na cidade de Túnis conversaram em várias ocasiões com opositores do regime líbio. Eram geralmente jovens que aparentavam pertencer a famílias ricas, alguns deles até ostentando emblemas da monarquia do rei Idris, afastado do poder por uma revolução popular comandada por Muammar Khadafi em 1969.
Alguns motoristas de táxi em Túnis, em tom irônico ao comentarem sobre a existência de hotéis superluxuosos, como o de nome Cartago, diziam que eram os locais de preferência de muitos líbios que deixaram o país de origem nos últimos meses.
Muitos líbios circulavam em Túnis com seus carros que eram identificados por placas diferenciadas com fundo branco. Não eram poucos e se somavam aos milhares de veículos circulando nas ruas e avenidas da capital tunisiana.
No dia da volta da delegação, os jornais brasileiros noticiavam que a Tunísia reconheceu o Conselho Nacional de Transição como único governo da Líbia.
Tunísia prepara eleição de Assembleia Constituinte
Em relação à Tunísia, os eleitores preparam-se para eleger a 23 de outubro próximo uma Assembleia Constituinte. Estão registrados 100 (cem mesmo) partidos. Alguns partidos islâmicos querem que a Tunísia volte ao tempo da sharia, a lei islâmica, que prevê, entre outras coisas, decapitações de mãos para determinados crimes, inclusive o roubo e assim sucessivamente.
O problema é complexo. Ditadores sanguinários e corruptos como Ben Ali, da Tunísia e Hosny Mubarak, do Egito, sempre usaram a força bruta para massacrar o povo com o pretexto de combate às Irmandades Muçulmanas. Os dois mencionados, que foram apeados do poder pelo povo, adotaram políticas econômicas neoliberais que resultaram no empobrecimento de parcelas significativas do povo e ainda o enriquecimento de seus familiares. Ben Ali, por exemplo, controlava bancos e áreas turísticas.
Motoristas de táxi em Túnis mostravam aos turistas estrangeiros prédios portentosos, inclusive sede de bancos, que pertenciam aos familiares do ex-ditador. E complementavam a informação com muito orgulho revelando que os bens foram confiscados pelo Estado tunisiano.
Em termos turísticos, a Tunísia atrai muitos europeus e asiáticos. É um país privilegiado em termos de belezas naturais e de história. Há quem diga até que a Tunísia é uma espécie de Turquia sem marketing. Ou seja, um país privilegiado pela natureza e bastante badalado em vários quadrantes, inclusive pela classe média brasileira com recursos para viajar. Comparem quando alguém diz que "estou indo para a Turquia" com outro que anuncia a ida para a Tunísia.
As autoridades tunisianas precisam apenas fazer alguns ajustes para que o país desenvolva ainda mais a sua principal atividade econômica, o turismo. Uma delas seria a criação de um eficiente sistema de coleta de lixo em Túnis, pois em muitas áreas da cidade tal serviço inexiste.
Pouco se sabe que na Tunísia na década de 50, logo após a independência em 1956, o carismático líder Habib Bourguiba instituiu uma espécie de Bolsa Família oferecendo subsídios do Estado para famílias de baixa renda. E quem recebia eram as mulheres, por serem consideradas o setor da sociedade em melhores condições para gerir o subsídio.
Bourguiba, um socialista e herói da independência, que mais tarde fez concessões ao esquema do deus mercado, acabou deposto e então Ben Ali ocupou o comando instituindo uma ditadura policial das mais violentas da região. Bourgiba aboliu o uso do véu pelas mulheres, o que se manteve posteriormente.
Como tudo que é proibido acaba sendo cultuado e até cobiçado, logo após a eclosão das mobilizações populares que resultaram na queda de Ben Ali muitas mulheres voltaram a trajar o véu e mesmo a burca. Nas ruas de Túnis podem ser vistas mulheres de véu e com trajes ocidentalizados.
Esta realidade vista na Tunísia confirma que qualquer tipo de imposição, não só na forma de trajar das mulheres como em qualquer são ineficazes e numa primeira oportunidade o que é considerado ilegal por determinadas autoridades caem. Obrigadas autoritariamente pelo Estado a trajar de uma forma, muitas mulheres respondem hoje desta forma. Mas ao contrário do que acontece em muitos outros países muçulmanos, como a Arábia Saudita, as mulheres tunisianas conquistaram direitos que são inalienáveis. De véu ou sem véu elas, por exemplo, dirigem normalmente seus automóveis e não são consideradas preconceituosamente, como acontece em muitos países de tradição machista, como barbeiras, o sinônimo de mau motorista.
O tráfego em Túnis também merece um capítulo a parte. Talvez seja um dos mais caóticos do mundo. Pode-se afirmar sem sombra de dúvidas que quem dirige na capital tunisiana está habilitado a dirigir em qualquer parte do mundo.
A empresa de seguro de automóveis que ingressar na Tunísia provavelmente aferirá lucros em grande escala. Parte dos automóveis em Túnis necessitam de serviços urgentes de consertos, pois rodam com latarias bastante avariadas resultantes de choques.
O povo é profundamente religioso. Neste mês de agosto, do Ramadan, para tudo às 13 horas, sendo que os seguidores do islamismo mantêm a tradição de jejum do nascer ao por do sol. No horário mencionado muita gente para nas ruas para a oração e com os corpos voltados para Meca. Nas proximidades das mesquitas podem ser ouvidas também convocatórias para a reza.
Nas noites, o povo sai às ruas em massa, sendo que a classe média ocupa restaurantes onde se apresentam conjuntos musicais alegres para a ceia constituída apenas de doces típicos do país. As comemorações estendem-se até de madrugada, mas às 9 horas da manhã as lojas e o vasto mercado popular chamado Medina voltam a funcionar normalmente.
A 23 de outubro, os eleitores terão de escolher entre os 100 (cem mesmo) partidos para constituir uma Assembleia Constituinte, que terá a incumbência de tornar a Tunísia um país com leis na área social, entre outras coisas.
Depois da revolução que resultou no fim de uma das ditaduras mais cruéis dos últimos tempos no mundo, a Tunísia abre caminho para novos tempos. Se por algum motivo o processo nesse sentido for interrompido, provavelmente o povo voltará a se manifestar nas ruas exigindo reformas verdadeiras.
Resta agora aguardar o resultado das urnas resultantes da eleição que para a Assembleia Constituinte, eleição esta a ser acompanhada por observadores internacionais integrantes apenas de representantes de entidades sociais. O governo decidiu que os governos estrangeiros não poderão mandar seus representantes para fiscalizar a eleição, cabendo esse direito apenas às entidades representativas dos movimentos sociais de todas as partes do mundo.
A Embaixada brasileiras na Tunísia sugeriu ao Itamaraty que fossem convidados representantes da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da União Nacional dos Estudantes (UNE) como observadores brasileiros nas eleições do próximo dia 23 de outubro (MAJ).